segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Silêncios


Jamais me ocorrera falar sobre um tema tão profundo como esse.

Trabalhei alguns anos com uma Classe Especial de Deficientes Auditivos, CE DA, como é comum nas Escolas Municipais, o uso de si
glas.

Ali conheci vários tipos de silêncio...

Tinha o silêncio de raiva, de busca, de tristeza, de angústia, de medo, de ausência...

O surdo, ao contrário do que se pensa, é extremamente ruidoso.
Seus ruídos caracterizam o seu estar no mundo, quais o arrastar dos pés, como a busca do equilíbrio corporal; o arrastar de mesas e cadeiras, os gritinhos constantes, monossílabos que significam frases completas; os palavrões muito bem articulados e pronunciados com raiva; ah, tem também a expressão burro! reproduzindo o tratamento recebido pelas pessoas bem próximas a eles.

Mas o fato gritante no dia a dia como parte dessa comunidade, são os múltiplos silêncios que eles são capazes de fazer.

Curioso é a capacidade que o professor comprometido com esse trabalho, com essa troca, tem, de entender, decifrar o significado dessas mensagens ali contidas, encerradas.

Muitas vezes, chega-se em casa com a mente em quase total exaustão, pela energia liberada nessa troca.

Sempre aprendi a respeitar a eloquência desses silêncios e ao final de algum tempo eu sabia exatamente o significado de cada um, de cada expressão, de cada olhar ou a ausência dele, a lágrima que teimava em não rolar.

Períodos difíceis, mas de grande aprendizado para mim.

Pedras brutas que aprendi a lapidar transformando-as em pedras preciosas ao meu coração.

Lembro-me que gostaria de aprender a ler em Braille, mas acabei aprendendo a ler trechos de uma linguagem especial, feita de silêncios, gritinhos, explosões de raiva ou de ternura, que ficaria impressa para sempre na minha memória afetiva.

CE DA
EM Professor Castro Rebello

Professora Dirce Sales

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Maria



Uma nota bastaria
para eu compor,
Maria,
a melodia que
expressasse o Amor
que ainda não sabemos
e as orações
que ainda
não dissemos,
oh, Mãe de todos nós!

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Amigos


Amigos, presente de Deus em nossas vidas!
E com que emoção e carinho os guardamos...
Ainda que distantes durante anos,
ao nos encontrarmos, quanta festa no coração!
Explicar esse segredo, a química
 que existe entre todos nós  é impossível! 
No entanto a gente sabe o sabor exato
que este prazer nos traz,                              
por sermos o que somos,
como somos na íntegra,
e sermos aceitos uns pelos outros,
sem julgamentos ou imposições;
e nos sabermos juntos e felizes simplesmente,
 como uma flor, um animalzinho de estimação,
um conto de fadas ou um pequeno verso;
 e com a alma repleta de bons desejos
uns para com os outros, vibrando na mesma
emoção e sintonia, como uma canção inesquecível
que compomos a várias mãos e cantamos emocionados,
ao sabor de Milton Nascimento:
“Amigo é coisa pra se guardar
debaixo de sete chaves...”
Feliz Ano Novo para todos nós!



terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Caleidoscópio

                              - Vinícius -
                          
- Tenho medo do escuro, dizia ele constantemente.
- E por que, Vinícius?
- Tem monstros. Muitos...
- E quando a noite chega, o que você faz?
- Só durmo com a luz acesa.
- Se faltar luz?
- Eu cubro a cabeça!
- Aí fica mais escuro ainda... Sabe, Vinícius, eu tenho uma ideia que talvez possa ajudá-lo a vencer esse medo.
- O que é?!
- Toda vez que vier o medo do escuro, pense nos cegos.
- Pra quê, professora?
- Porque quando anoitece, você pode acender uma lâmpada ou uma vela para afastar os seus monstros e fantasmas, mas e eles?
Vinícius me olhou como se me visse pela primeira vez e se foi.
Era o recesso de julho.
Algum tempo depois, ao retornarmos às aulas, ele aproximou seu rosto do meu e disse com um ar de cumplicidade:
- Perdi o medo do escuro!

Eu ainda tenho os meus próprios medos, mas quando me lembro do meu ex-aluno e da minha receita tão simples e tão eficaz para ele, vou me esquecendo deles por aí...