segunda-feira, 25 de julho de 2016

Cartão de crédito


A mulher, aproveitando-se das circunstâncias, reduz o marido a pó!
O motivo?  Ele esquecera o cartão de crédito em casa e a compra teve que ser cancelada.
Não satisfeita em humilhá-lo no estabelecimento comercial, veio vociferando pelo caminho:
- Você não presta pra nada mesmo... Nem pra fazer a alegria do nosso neto, que espera pelo brinquedo há dias... E eu que ainda me fio em você... É bem feito pra minha cara!
Chegando em casa, acaba de despejar a raiva sobre a criança que brincava tranquilamente no balanço do quintal:
- O traste do seu avô, esqueceu o cartão em casa e você ficou sem seu brinquedo. Veja lá se não vai seguir o exemplo dele quando crescer também.
O marido, visivelmente amargurado, a cara amarrada, o velho arrependimento de não ter desfeito aquele casamento há anos, joga-se na poltrona da saleta e esconde o rosto entre as mãos.
O menino aproxima-se, o abraça com carinho e na simplicidade terna das crianças, fala com sabedoria:
- Vovô, só tem uma coisa que você não pode esquecer nunca!
E o avô, ainda mergulhado naquela atmosfera pesada, levanta a cabeça, sustenta o olhar da criança e pergunta com desalento:
- E o que pode ser mais importante do que um cartão de crédito, menino?

- A sua alegria, meu avô!

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Poderes


O prefeito continuava falando ao telefone, em pé e de frente para a imensa e panorâmica janela de seu gabinete, embora tivesse autorizado a entrada de sua próxima entrevistada.
Quando após alguns arrastados minutos finalmente dignou-se a encerrar o telefonema e voltar-se para sua mesa, quase caiu!
A sua frente, uma linda mulher de cabelos negros e lisos, quase à cintura, emoldurando um rosto perfeito, com duas covinhas estonteantes esperava em silêncio e uma certa ironia no olhar.
O homem, sem conseguir disfarçar a própria surpresa, saiu tropeçando nas palavras.
- Desculpe-me, mas sabe como é vida de governante... Você é...
- Violeta. Decidi vir pessoalmente falar com o senhor porque, infelizmente, por telefone é impossível!
- Vou mandar investigar essa situação do telefone imediatamente. Mas em que posso ajudar?
- Recebi esta multa da prefeitura e este aviso para não exercer mais a minha profissão, disse ela girando o corpo para pegar o documento dentro da bolsa, enquanto o prefeito, sem a menor discrição, percorria com o olhar seu belo corpo moreno.
- Deve estar havendo algum engano, senhorita.
- Senhora.
- Perdoe-me, senhora. Do que se trata mesmo?
- Sou cartomante e o senhor proibiu a propaganda do meu trabalho. Mandou apagar o anúncio que paguei caro, para pintarem nos muros da cidade. Como as pessoas vão saber que eu existo, se eu não divulgar, senhor prefeito? O que o senhor tem contra a minha profissão?
- Eu?! Deve haver algum lamentável engano. Eu acredito em cartomancia. Vou até confiar-lhe um segredo: minha avó lia cartas.
- Mas por que tem que ser um segredo? Ler cartas é um dom, um privilégio. Se assim não fosse, todo mundo estaria apto a fazer isso. Ou o fato deve ser segredo por tratar-se da avó de uma autoridade?
- Sabe como são as questões políticas... muitas vezes temos que parecer o que não somos para não ferir interesses...
- Realmente eu nada sei sobre questões políticas, mas sei bastante da profissão que exerço e que preciso dela para sobreviver. Cartomantes pagam contas e impostos, e o senhor há de convir que os impostos que pagamos no Brasil, além de serem muitos, são altíssimos!
- Nem me fale! Mas pode deixar que vou ver com calma a sua situação.
- O prefeito me desculpe, mas eu preciso que o senhor RESOLVA a minha situação, e não a veja com calma. As contas podem até esperar, mas os juros não recebem ordens...
- Vamos resolver. Por acaso a Madame trouxe as suas cartas?
- Sim. Tenho um atendimento agendado para hoje a uma grande dama da sociedade e por isso as trouxe comigo.
- Grande dama da sociedade, é? Eu devo conhecer, com certeza. De quem se trata?
- Por questões éticas não posso, nem devo, revelar nomes.
O prefeito aciona o interfone e dá uma ordem à secretária:
- Estou em reunião.
- Sim senhor.
A cartomante forra uma parte da mesa presidencial com sua toalha de seda com pinturas emblemáticas, cobre os ombros com um belíssimo xale espanhol, retira o baralho de uma caixa recoberta em pedrarias exóticas, diz algumas palavras cabalísticas, coloca as cartas sobre a toalha e pede ao prefeito para cortar o baralho com a mão esquerda.
  Com os olhos ora fixos nas cartas, ora nos olhos daquele homem que comanda o destino de uma cidade enorme, mas, que, literalmente, agora está em suas mãos, ansiando por suas palavras e pelo seu corpo também, ela joga.
Responde a quase tudo que ele quer saber, menos que a alta dama da sociedade que dali a algumas horas ela atenderá em um local discreto e afastado do centro da grande cidade, trata-se de sua própria mulher...

“As cartas não mentem jamais!” Mas as cartomantes podem omitir o que não lhes convém revelar.