domingo, 19 de abril de 2020

Colóquio


Oi, poeta!

Você nem imagina o quanto eu gostaria de dar-lhe um longo e caloroso abraço e um beijo sem pressa de acabar...
Não precisa erguer a sobrancelha com aquele ar de ponto de interrogação também.
Vou explicar:
Nesse tempo interminável de quarentena, eu, que sempre me dei bem comigo mesma, desejei uma companhia para as minhas caminhadas matinais. E não é que ao virar a esquina, vindo em minha direção em passos firmes e seguros, vejo um dos seus poemas, meu caro?
Pois ele aproximou-se no maior sorriso, me abraçou uma, duas, três vezes, e, num gesto espontâneo e natural, me ofereceu o braço, que eu é claro, imediatamente aceitei!
Ah, como conversamos! Sabe aqueles velhos amigos que ao se encontrarem parece que o assunto nunca se esgota? E falamos de tudo, ou quase tudo, porque os temas desagradáveis ou pesados são muito desgastantes e cá entre nós, a gente já está meio cansado de ouvir isso todo dia, concorda comigo?
De repente nos demos conta que era hora de voltar, mas ele fez questão de me acompanhar até o prédio onde moro e confesso, senti uma ponta de tristeza ao saber que precisaríamos nos afastar, mas ele muito atento, percebeu o fato e num novo abraço comprometeu-se a voltar amanhã, no mesmo horário.
Já estou contando as horas, poeta.
Faltam-me palavras para agradecer a você essa oportunidade ímpar, eu juro!
Enquanto te escrevo, poeta, eu penso com tristeza em tantos poemas que permanecem em quarentenas forçadas por tanta gente que faz um pouco caso tão grande de poesia...
Sabia que um colega meu teve a parcimônia de me dizer que ele fez questão de comprar muitos livros de poesia, os deixa bem limpos e impecáveis na estante  da sala para exibi-los com orgulho às visitas, mas nunca abriu um deles, acredita?!
Olha, se essa gente soubesse quantos bons companheiros e muitas vezes, grandes conselheiros até nos são enviados por vocês, que têm a magia de dar corpo às ideias num estilo único e tão especial, talvez houvesse menos enfermidades, menos solidão, menos falta de assunto, menos desencanto, não é mesmo?
Uma pena que não possa me estender aqui nessa carta, que talvez até se transforme num poema, ou trova, uma crônica ou até um conto, por suas mãos mágicas. Quer saber por quê?
Vou pintar o cabelo, fazer as unhas e separar uma roupa bem maneira para me encontrar com seu galante poema amanhã. Quem sabe iremos a um café para mais um dedo de prosa... To tão animada...
Amanhã eu te conto.
Tchau.
Ah, obrigada pela atenção.