sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Peregrinos do universo




Encontrar-Te em cada olhar,
ver no outro um irmão,
entender que a paz se encontra
dentro do meu coração.

Desde o brilho da manhã
ao encanto do luar,
ver em tudo a poesia
que Ele veio ensinar.

Peregrinos do universo,
Uno e Versos em canção,
escrevendo pouco a pouco,
o poema infinito
que trouxemos das estrelas...

Encontrar-Te em cada olhar,
ver no outro um irmão,
aprender que o amor
é nossa religião.



quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Mansinha



- Deita, Genisse! Faz que tá morto!

Assim gritavam meus tios, da varanda da casa de vovó, que próxima ao curral,permitia-lhes assistir uma cena tragicômica vivida pelo irmão que voltava da boemia, bem cedinho.

Mansinha, uma vaca mocha, brava como o cão, e de cria nova então, um perigo! estava no lugar certo mas na hora errada para tio Genecy - ou Genisse, para os irmãos - que teve a infeliz ideia de cortar caminho pelo curral. Ao vê-lo, ela partiu pra cima do infeliz como um raio!

Sem outra alternativa, ele jogou-se ao solo e ali ficou, hirto como um graveto, os braços colados no corpo, a respiração suspensa, a boca cerrada e os olhos fechados.

Ela aproximou-se, parou e sem poder atingi-lo, urinou e defecou sobre o coitado que nem respirar podia!

Nisso os irmãos, munidos de garruchão – uma vara roliça com um arpão na ponta – e que pressionada no corpo do animal o faz recuar pela reação dolorosa que causa, vieram em seu socorro.

Uma vez afastada a ameaça, o coitado viu-se preso às gozações dos irmãos, às reprimendas de minha avó e de um banho, que por mais demorado que fosse, demorou toda uma vida para tirar a impressão do cheiro e da angústia vividos.


quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Conversê




- Comadre Nora, a comadre tá alembrada de Joana?
- Qual é Joana? Joana de Preto?
- Não. Joana de Borges, cria de Venceslau.
- Mãe de Quinzinho, o doutor que virou trapezista e de Doralice que foi estudar nas europas e voltou prenha?
- Mas não é?
- A viúva de Borges, que fazia dentadura e o povo pagava com um capado*, uma rês, um ganso ou um engradado de cerveja?
- Em pessoa...
- Me alembro, como se fosse hoje, quando ela se mudou daqui da rua, toda emproada, boatando a quatro ventos que desse lado de cá do rio não era ambiente pra criar os filhos, que o povo de cá só queria saber de conversê por cima do muro ou no portão de casa, mas isso tudo era só desculpa pra assuntar a vida dos outros.
- Isso mesmo.
- O, pessoa entojada!
- Nem me fale...
- Mas o que tem ela?
- Pois não é que a criatura me achou de morrer?!
- Valei-me, Santo Amaro! E eu aqui falando mal da finada...
Ainda bem que Deus perdoa... A pobre tinha lá os seus defeitos, mas...
- É, a gente sabe, né? Mas...
- Foi quando?
- Ontem, tarde da noite.
- E quem deu a notícia pro cê?
- O Vigário. Veio aqui cedinho! e de bicicleta, o santo!
- Não sei como não cai com aquela saia comprida nessa ventania...
- Comadre...
- Mas morreu do que mesmo, Genô?
- Não sei direito não, mas diz o povo, que ela morreu de miolo cozido.
- Ó que eu tenho pra mais de setenta e nunca escutei falar nessa maleita... O que houvera de ser?
- Que o povo não me escute, mas é bem capaz de ser que ela tivesse incomodada e daí teimou, lavou a cabeça e garrou secar o cabelo debaixo do sol quente.
- Mas foi o vigário que falou isso tudo pro cê, Genô?!
- Não, Nora, já se viu? Eu to aqui caçando na memória, coisas lá da minha infância e tenho pra mim, que muitas manias que rezava os antigos era certa, viu?                                                              
Vó Zenaide ensinou pra mãe e mãe ensinou mais eu, quando fiquei mocinha, que lavar a cabeça quando a gente fica  incomodada, ou faz maluquecer, ou cozinha os miolos e mata... Ó a prova!
- Bom, eu não gosto muito de velório, porque sou muito impressionada e fico vendo o defunto em tudo quanto é canto depois, mas em respeito a Santa Madre Igreja, vou prestar a última homenagem à finada. Vai comigo, Genô?
- Me deixa caçar um galhinho de arruda primeiro, Nora.
- Mas qual que é a serventia?
- Mãe dizia que é bom colocar um raminho atrás da orelha por causa de que o cheiro afasta as almas penadas.
- Cruz credo! Não fala essas coisas dentro de casa não, mulher! isso atrai! Ai, fiquei toda arrepiada... E se benze.
- Pega o terço, Nora.
E lá se vão as duas tagarelando pela rua sobre os mistérios da vida e da morte.

(*) Capado era um termo usado na roça para designar o porco bem gordo.



terça-feira, 18 de novembro de 2014

Espelho




No camarim do meu coração
eu me desnudo, me demaquio
e desconstruo os outros eus
em descompasso com a solidão
deixando-os em desalinho,
mas por ali, sempre à mão.
E sorrio para mim, buscando no outro eu
que se delineia no espelho do tempo -
este implacável senhor de todos nós -
um bom conselho, uma poção talvez,
que adoce as amargas desilusões do viver.



quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Divina Sinfonia



Os planetas assim reunidos
em circunvoluções na pauta do infinito
produzem acordes tão nonitos,
inesquecíveis aos nossos corações.
E Deus, o Maestro sublime,
rege incansavelmente,
a melodia infinda,
a sinfonia mais linda,
linda, linda,
que se chama VIDA!

domingo, 2 de novembro de 2014

Cotidiano




Minha bisavó materna, libanesa, brava como ninguém, apesar de muitos anos no Brasil, jamais conseguiu dominar o nosso idioma.

Por causa disso, ocorreram algumas situações que apesar de dramáticas para ela, não deixavam de ser pitorescas para nós, como por exemplo, o episódio da bilheteria da estação ferroviária.

Acompanhada de uma das netas, ela aproximou-se da bilheteria e disse com seu sotaque carregado:

- Quero “bassage” para “novebessoa”

O funcionário rapidamente destacou os nove bilhetes e entregou a ela que começou a esbravejar e xingar na sua língua natal e batendo o pé, repetia:

- Eu dizer bassage pra novebessoa!

- Então senhora! Estão aqui as nove passagens.

- No! No! No! Fala netinho minha. Fala, filino, fala bra onde vovó ta indo...

- É pra Nova Iguaçu!                  


E a confusão continuou até a chegada providencial de meu avô que sabia bem o que era preciso fazer numa situação dessas.